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Lava Jato é necessária, mas não suficiente para acabar com a corrupção

Gesner Oliveira

02/06/2017 04h10

A operação Lava Jato completou pouco mais de três anos. Em um Brasil acostumado à impunidade, os números são impressionantes: mais de 200 prisões, aproximadamente 130 delações premiadas, cerca de 330 pessoas denunciadas, para citar apenas alguns. A operação coloca os atos ilícitos no centro do debate. Há quem acredite que a Lava Jato em si irá acabar com a corrupção, mas infelizmente o país precisa mais do que isso.

A Operação Lava Jato, em andamento desde 2014, demonstra grande semelhança com a Operação Mãos Limpas, tendo sido chamada inclusive de "Mãos Limpas brasileira". Mani Pulit, como era chamada em italiano, a operação gerou profundas mudanças no quadro partidário italiano, com o desaparecimento de vários partidos políticos. Muitos empresários cometeram suicídio quando os seus crimes foram descobertos, enquanto outros se tornaram foragidos.

Durante a campanha da operação Mãos Limpas, houve mais de 2.800 mandados de prisão, 6.059 pessoas investigadas, dos quais quatro haviam sido primeiros-ministros. A esperança era de que a Mani Pulit também exterminaria a corrupção na Itália. Mas não foi isso que aconteceu.

Mais de 20 anos depois a Itália continua sendo um país corrupto. No Índice de Percepção de Corrupção, a Itália é o 60° país mais corrupto de um total de 176 e não sofreu nenhuma grande evolução nos últimos anos. Para que o Brasil não tenha o mesmo destino, é preciso combater os três tipos de corrupção: sistêmica, endêmica e sindrômica. A tese é do professor Michel Sendel, da Universidade de Harvard. O nome pode soar estranho, mas o significado é bem familiar dos brasileiros.

Corrupção sistêmica é a grande corrupção, dos grandes desvios de verbas, dos financiamentos ilegais de campanha. É este tipo de corrupção que a Lava Jato combate.

A corrupção endêmica é aquela do dia a dia, a chamada microcorrupção. Ela se combate através das leis e também de uma população ativa que não permite um terceiro parar em fila dupla, por exemplo, ou pular a catraca do metrô.

Por último a corrupção sindrômica é aquela se origina da falta de preparo dos gestores. Ela é a mais sutil de todas e nasce quando alguém, geralmente um gestor público ou um executivo, desconhece o assunto sobre o qual se está decidindo. Nestas situações, nascem obras com valores inflacionados, compras de empresas por um valor acima do normal, entre outros. A corrupção sindrômica não surge, em si, pela má intenção do gestor, mas pelo despreparo dos tomadores de decisão que não conhece om real custo das coisas. O resultado, porém, é o mesmo: ela permite que os mal-intencionados possam levar vantagens impróprias.

Esta semana, foi divulgado o relatório Global de Competitividade de 2017. No quesito corrupção, o Brasil ficou em 63°, de um total de 64 países,  à frente apenas da Venezuela. Se o Brasil não quiser ter o mesmo destino da Itália, que após a operação Mão Limpas continuou sem evoluir nos rankings de corrupção, é necessário mais do que a Lava Jato. É necessário combater a grande corrupção, a do dia a dia e o despreparo dos gestores nas tomadas de decisão.

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Sobre o autor

Gesner Oliveira é ex-presidente da Sabesp (2006-10), ex-presidente do Cade (1996-2000) e ex-secretário de Acompanhamento Econômico no Ministério da Fazenda (1995) e ex-subsecretário de Política Econômica (1993-95). É doutor em Economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), sócio da GO Associados, professor de economia da FGV-SP e coordenador do grupo de Economia da Infraestrutura & Soluções Ambientais da FGV. Foi eleito o economista do ano de 2016 pela Ordem dos Economistas do Brasil (OEB).

Sobre o blog

Você entende o que está acontecendo agora na economia? E o impacto que a macroeconomia tem sobre sua vida? Quando o emprego voltará a crescer? Como a economia impacta sobre o meio ambiente? Vale a pena abrir uma franquia? Investir em ações da Petrobras? Este blog se propõe a responder a questões desse tipo de maneira didática, sem economês.

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