Reajuste do Supremo agride o ajuste fiscal e a República
Gesner Oliveira
27/11/2018 17h04
A decisão do presidente Temer de sancionar o reajuste dos ministros do Supremo foi errada e inoportuna. Dá um sinal contrário àquilo que se quer transmitir à sociedade: é urgente conter gasto para eliminar um rombo fiscal que anda na casa dos R$ 130 bilhões neste ano.
Como pedir à população que aceite as inevitáveis contenções de gasto público, se uma categoria acaba de receber reajuste de mais de 12% acima da inflação?
Como pedir à população que respeite as regras da República e a independência dos Poderes, se Executivo e Judiciário selam acordo de reajuste de salários?
Em linha com esse acordo prévio entre Executivo e Judiciário, o ministro do STF Luiz Fux revogou o pagamento do auxílio-moradia para juízes, integrantes do Ministério Público, defensorias públicas e tribunais de contas.
A eliminação do benefício seria uma suposta compensação concedida pelo Judiciário em troca do aumento de salário. Mas apenas parcial. As estimativas variam, mas projeta-se uma perda líquida anual de cerca de R$ 5 bilhões com a implementação das duas medidas. Se o governo ainda defende o ajuste fiscal, não poderia aceitar essa perda líquida adicional.
Embora o impacto sobre as expectativas seja ruim, já havia um cheiro de acordão no ar. As declarações do presidente Temer insinuavam a sanção e até as críticas do presidente eleito, Bolsonaro, foram menos enfáticas do que de costume.
Isso restringe ainda mais a margem de manobra para o próximo governo, revelando como é importante um projeto como o de revisão do contrato de cessão onerosa da Petrobras, que poderá aliviar o caixa do Tesouro, e uma redefinição de prioridades para acomodar as despesas adicionais.
Mas o brasileiro tem fé! Apesar dos inúmeros problemas da economia, a confiança do consumidor no futuro aumentou, segundo pesquisa da Fundação Getulio Vargas (FGV). Alcançou o maior nível em mais de quatro anos.
O desafio do governo Bolsonaro será atacar de frente o problema do rombo fiscal sem frustrar expectativas relativamente otimistas sobre o comportamento da economia. Uma tarefa nada fácil.
Sobre o autor
Gesner Oliveira é ex-presidente da Sabesp (2006-10), ex-presidente do Cade (1996-2000) e ex-secretário de Acompanhamento Econômico no Ministério da Fazenda (1995) e ex-subsecretário de Política Econômica (1993-95). É doutor em Economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), sócio da GO Associados, professor de economia da FGV-SP e coordenador do grupo de Economia da Infraestrutura & Soluções Ambientais da FGV. Foi eleito o economista do ano de 2016 pela Ordem dos Economistas do Brasil (OEB).
Sobre o blog
Você entende o que está acontecendo agora na economia? E o impacto que a macroeconomia tem sobre sua vida? Quando o emprego voltará a crescer? Como a economia impacta sobre o meio ambiente? Vale a pena abrir uma franquia? Investir em ações da Petrobras? Este blog se propõe a responder a questões desse tipo de maneira didática, sem economês.