Liberar a volta da bagagem grátis em voos é populismo para a arquibancada
Gesner Oliveira
23/05/2019 10h38
A Medida Provisória 863 foi aprovada pelo Senado e pela Câmara com direito a agrado populista para a galera. Além de permitir a participação de 100% de capital estrangeiro nas empresas aéreas, objeto central da MP 863, entrou de carona a volta da bagagem grátis em voos nacionais e internacionais.
A chance de sair bobagem quando a autoridade interfere no mecanismo de mercado é quase 100%. Cobrar para despachar bagagem é uma prática frequente em outros mercados, e proibir isso por aqui é apenas mais um exemplo de mentalidade intervencionista no Brasil.
A medida pega bem junto ao público, mas não faz sentido do ponto de vista técnico. Muitos passageiros vão ficar contentes porque poderão levar suas malas sem por a mão no bolso na hora de embarcar.
Pura ilusão, pois o custo estará embutido no preço da passagem e rateado com aqueles passageiros que, a despeito de não levarem bagagem, subsidiam quem ocupa um espaço da aeronave que tem valor econômico.
Os defensores da mudança alegaram que a implementação da cobrança de bagagem não reduziu o preço das passagens aéreas. Não lhes ocorreu que seria importante demonstrar isso com evidências estatísticas robustas.
Na verdade, não encontrariam tais provas. Os números sugerem o contrário daquilo que é alardeado, pois houve um choque de custo que não foi integralmente transferido para os preços.
De fato, a cobrança por bagagens foi aprovada em dezembro de 2016 e, desde então, o preço do barril de petróleo subiu 31%. Já o dólar teve uma alta de 20% no mesmo período. O impacto destes dois itens explicaria um aumento de até 50% nos preços das passagens. No entanto, segundo o IBGE, o aumento médio das passagens aéreas no período foi de 10%, abaixo, portanto, da elevação dos custos.
Quando se considera o efeito estatístico isolado da cobrança de bagagem, é possível verificar uma diminuição no preço, mas isso não aparece no debate raso que se faz sobre o tema.
O benefício da medida da Anac só não foi maior porque quase não há concorrência nesse mercado. O consumidor tem poucas alternativas de companhias aéreas e paga preços em voos domésticos que poderiam levá-lo a outros continentes se houvesse mais concorrência.
Com mais competição, é possivel até que algumas companhias optassem por não cobrar bagagem, mas como uma estratégia privada de marketing, e não como uma regra de intervencionismo idiota.
Daí a importância de abrir para o capital estrangeiro, bem como reduzir impostos escorchantes sobre combustíveis, privatizar a Infraero e os aeroportos regionais e tantas outras medidas para fazer o mercado funcionar de forma mais competitiva, em benefício do bolso do consumidor e da economia do país.
Sobre o autor
Gesner Oliveira é ex-presidente da Sabesp (2006-10), ex-presidente do Cade (1996-2000) e ex-secretário de Acompanhamento Econômico no Ministério da Fazenda (1995) e ex-subsecretário de Política Econômica (1993-95). É doutor em Economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), sócio da GO Associados, professor de economia da FGV-SP e coordenador do grupo de Economia da Infraestrutura & Soluções Ambientais da FGV. Foi eleito o economista do ano de 2016 pela Ordem dos Economistas do Brasil (OEB).
Sobre o blog
Você entende o que está acontecendo agora na economia? E o impacto que a macroeconomia tem sobre sua vida? Quando o emprego voltará a crescer? Como a economia impacta sobre o meio ambiente? Vale a pena abrir uma franquia? Investir em ações da Petrobras? Este blog se propõe a responder a questões desse tipo de maneira didática, sem economês.