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Blog do Gesner Oliveira

Como o Brasil pode reagir ao ataque de Trump

Gesner Oliveira

15/03/2018 17h02

Diante do ataque protecionista de Trump, o Brasil precisa escolher a melhor forma de reação. Segundo o Presidente Temer, o governo brasileiro estaria estudando alternativas. O país deveria agir rápido. Sem bravatas, mas de forma incisiva.

A primeira possibilidade é não fazer nada. Sofrer em silêncio não parece ser uma alternativa. O poder de barganha do Brasil é limitado perante os EUA, mas é possível negociar.

A segunda possibilidade é iniciar negociações bilaterais com os Estados Unidos. Populismo à parte, a iniciativa de Trump tem como objetivo rediscutir os termos comerciais. A elevação das alíquotas de importação do aço e do alumínio é o bode na sala. Para retirá-lo há um preço a pagar mediante concessões comerciais aos EUA.

É improvável que Trump se dê conta disso, mas ele rompeu com as teorias clássica e neoclássica do comércio e aplicou uma versão radicalizada da chamada nova teoria do comércio desenvolvida nos anos oitenta do século passado. Nesta, os eventuais ganhos dependem da interação estratégica entre os países que fazem o jogo do comércio.

Em vez de muita conversa, o governo brasileiro deveria entrar logo com uma representação na Organização Mundial do Comércio (OMC). É o caminho natural e em linha com as regras da economia mundial. A elevação unilateral e arbitrária das alíquotas de importação pelos EUA não responde a qualquer indício de comércio desleal. Trump sabe disso. Do ponto de vista estritamente técnico, uma representação na OMC seria vitoriosa.

Sempre que um país membro percebe que outro está violando alguma norma dos acordos da OMC, solicita que sejam feitas consultas na Organização sobre o caso. Após as consultas, caso seja constado que possa ter ocorrido uma violação, o país reclamante pede a formação de um "Painel", formado por árbitros da OMC que decidirão acerca do caso.

Após a decisão final do Painel, tanto o reclamante quanto o reclamado poderão recorrer ao Órgão de Apelação da OMC. Caso a decisão final do Órgão seja de que o reclamado realmente estava violando algum acordo da OMC, poderá permitir que o reclamante imponha sanções comerciais. Desnecessário lembrar que essa novela pode demorar anos.

Depois desse  processo demorado e custoso, o país vencedor terá  direito à retaliação. Isso pode se traduzir em aumento de alíquotas contra produtos dos EUA, encarecendo o consumo ou a produção no Brasil. Um jogo de soma negativa.

Mas então por que representar na OMC? Porque o processo formal ajuda a reunir farta evidência do absurdo da medida dos EUA. Não só para o mundo, mas para a própria indústria dos EUA, cujos custos aumentam com o encarecimento do aço e alumínio importados. Ao mesmo tempo o Brasil deve ser proativo nas negociações bilaterais (já previstas no processo da OMC) e na divulgação junto aos setores interessados nos EUA e especial ao Congresso daquele país dos benefícios de uma isenção ao Brasil.

Ninguém se iluda com grandes vitórias. Contencioso comercial é sempre difícil e raramente leva a uma solução ganha-ganha. Mas, de qualquer forma, neste jogo estratégico, o Brasil não tem muita opção senão entrar na barganha com as poucas armas que dispõe. Isso inclui o recurso a um xerife fraco demais para o jogo violento do comércio internacional.

Sobre o autor

Gesner Oliveira é ex-presidente da Sabesp (2006-10), ex-presidente do Cade (1996-2000) e ex-secretário de Acompanhamento Econômico no Ministério da Fazenda (1995) e ex-subsecretário de Política Econômica (1993-95). É doutor em Economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), sócio da GO Associados, professor de economia da FGV-SP e coordenador do grupo de Economia da Infraestrutura & Soluções Ambientais da FGV. Foi eleito o economista do ano de 2016 pela Ordem dos Economistas do Brasil (OEB).

Sobre o blog

Você entende o que está acontecendo agora na economia? E o impacto que a macroeconomia tem sobre sua vida? Quando o emprego voltará a crescer? Como a economia impacta sobre o meio ambiente? Vale a pena abrir uma franquia? Investir em ações da Petrobras? Este blog se propõe a responder a questões desse tipo de maneira didática, sem economês.

Gesner Oliveira